quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Para que agredir se ignorar ofende muito mais?

Quando eu era pequena costumava dar uma volta de mãos dadas com minha avó pelo quarteirão. Não me lembro de algum fato isolado. Minha única memória era de sempre obrigá-la a atravessar a rua quando tinha um "aglomerado" de garotos conversando na calçada. Eu deveria ter uns 4 anos de idade e eles 9, 11, sei lá. Só sei que ela me dizia: você está comigo, não se preocupe, apenas ignore.

Acho que nunca contei esta história pra ninguém, mas até hoje me sinto perdida (já que não estou segurando a mão da vovó) quando estou andando na rua e vejo um monte de homens reunidos, seja em volta do carro, em volta de uma cerveja, em volta de uma presa (lê-se: a mulher que eles estão querendo pegar), mesmo sabendo que basta eu ignorá-los (o que facilita muito partindo do principio que sou quase invisível aos olhos deles) para eu seguir meu caminho. Bom, mesmo assim, ainda atravesso a rua, 100 metros antes, para o outro lado da calçada.

Hoje foi um destes dias. Me peguei dando ziguezague na avenida tamanha a concentração de homens reunidos jogando conversa fora. O triste foi quando me vi encuralada e tive que escolher qual grupo de homens me metia menos medo: os pedreiros em frente de uma obra do lado esquerdo da rua, os eletricistas que tentavam tirar o gatinho do fio elétrico do lado direito da rua, ou os homens de terno que camuflavam revistas de nudez embaixo dos braços.

Eu era tão mais feliz quando eram só gays. Minha rua estava protegida por pessoas que não dariam a menor bola pra mim (ou para minha bolsa) quando eu passasse por ela. Tudo bem que eu não poderia dar mancada de deixar o cabelo despenteado demais ou usar uma roupa tão fora de moda a ponto de afrontá-los. Mas, fora isso, tudo corria seguro a caminho de casa.

Ultimamente tenho tido mais outro probleminha. Hummmm, como posso dizer... Eu e minha capacidade instantanêa de rir pra todo mundo e por isso as pessoas se considerarem meus amigos íntimos a ponto de não se contentarem mais com um bom dia ou boa tarde de educação, passando para a fase de um abraço caloroso e espontâneo todo santo dia, entre eles: o cara da banca de revistas que fica fascinado quando lhe conto histórias sobre minha saúde que não anda nada bem, o ex-presidiário mudo que vende canetas no semáforo e faço um esforço tremendo para acreditar que melhor ter ele como meu aliado do que correr o risco de ser roubada pela gangue dele, o vendedor de pipoca doce que insiste que eu leve uma como cortesia da casa, a moça do caixa de supermercado que não se conforma por eu não dar detalhes (como mês e nome) sobre o filho que não estou esperando e mesmo assim espera que eu a convide para madrinha, o motorista de táxi que sabe exatamente a que horas saio do serviço e fica esperando pra saber se não esqueci de levar o guarda-chuva pois está em estado de alerta nas minhas redondezas.

Porém o maior de todos os problemas está no fato de eu não acreditar realmente que sou superior a ninguém a ponto de menosprezar estes trabalhadores que para o bem ou para o mal são a companhia que tenho, e nem de que sou tão inferior assim a ponto de não ser a conversa dos homens e suas rodinhas quando eu passo na rua.

Agredir ou Ignorar? Melhor continuar sendo agradável enquanto isto não tiver me arrancando pedaços.

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